HOMILIA II DOMINGO DA PÁSCOA (Jo 20,19-31)
D. Paulo DOMICIANO, OSB
O segundo domingo da Páscoa, na liturgia bizantina, é também chamado
de “Domingo de Tomé”, visto que o Evangelho proclamado neste dia é o
do encontro do Ressuscitado com o apóstolo Tomé. Mas na tradição
latina, este domingo da Páscoa é tradicionalmente chamado “Domingo in
albis” (Domingo em branco), porque os que eram batizados na noite
pascal portavam suas túnicas brancas até este domingo. Durante toda a
semana eles participavam das catequeses mistagógicas, que eram
catequeses dadas pelo bispo e que explicavam e aprofundavam o sentido
dos ritos e dos sacramentos (mistérios) recebidos. Deste modo, podemos
entender melhor o sentido da antiga antífona de entrada que cantamos
hoje: “Como crianças recém-nascidas, desejai o puro leite espiritual para
crescerdes na salvação, aleluia!” (1Pd 2,2), que nos lembra que, como
crianças revestidas de vestes puras, devemos manter brancas nossas
vestes batismais na vida de cada dia. A oração da liturgia de hoje também
nos fala dos sacramentos da iniciação: “E fazei que compreendamos
melhor o Batismo que nos lavou, o espírito que nos deu nova vida
(Confirmação) e o sangue que nos redimiu (Eucaristia)”. Assim, a liturgia
de toda esta semana e, particularmente, hoje está ligada ao tema do
batismo.
Em abril do ano 2000 o pp João Paulo II instituiu que o segundo domingo
da Páscoa seria dedicado à Misericórdia divina. Além do ambiente
batismal, a liturgia deste domingo também se refere à Misericórdia
divina, visto que a própria Oração de hoje se inicia com a invocação: “Ó
Deus de eterna misericórdia”. De modo especial, gostaria de me deter no
Evangelho que, sem dúvida, nos revela de modo surpreendente a
Misericórdia manifestada por Jesus, pelo menos por três motivos:
1- Ele aparece aos discípulos que o negaram, o traíram e o
abandonaram e lhes traz não rancor ou castigo por tudo o que
aconteceu, mas lhes anuncia a Paz;
2- Jesus não vem cobrar nenhuma explicação, mas vem lhes dar o
dom prometido antes de tudo acontecer: o dom de seu Espírito. Ele
vem cumprir sua promessa por mais que os discípulos não tenham
sido fiéis ao seu compromisso, se separando dele no momento mais
decisivo de sua vida;
3- Ainda nesta situação de “segundo chance”, Tomé, com sua
incredulidade, coloca condições para crer. Mas Jesus não o
abandona, vai ao encontro de sua fraqueza e aparece uma segunda
vez para socorre a falta de fé de seu amigo.
De fato é um Domingo de Misericórdia, porque o Ressuscitado está
conosco e é Ele mesmo a Misericórdia. Mas não é só isso… O Senhor nos
revela e nos dá a sua Misericórdia, o seu perdão, e faz de cada um de nós
um ministro da misericórdia e do perdão recebidos. Quando Ele nos
perdoa e nos cura de nossos pecados, como faz hoje com os apóstolos
reunidos no cenáculo, Ele também nos capacita e nos envia para o perdão
e a misericórdia: “A quem perdoardes os pecados, eles lhes serão
perdoados; a quem os não perdoardes, eles lhes serão retidos”.
É claro que o Senhor não espera que façamos isso com nossas próprias
forças (seria um fracasso!). Ele nos dá o seu Espírito, que nos renova e
capacita: “Recebei o Espírito Santo”. Como batizados, somos enviados por
Cristo ressuscitado a sermos os continuadores, os ministros de sua obra
renovadora no mundo inteiro; de sua obra de reconciliação. “Como o Pai
me enviou, também eu vos envio”. Eu vos envio para que sejam
testemunhas da Ressurreição, da vida nova que vocês receberam;
testemunhas da misericórdia e do perdão que vos foram concedidos em
abundância. Contudo, somente aquele que reconhece que precisa de vida
nova a recebe. Somente aquele que reconhece suas misérias recebe
misericórdia. Somente o que reconhece que pecou recebe o perdão.
Se não fazemos essa experiência fundamental do Amor de Cristo por nós
também não somos capazes de testemunhá-lo. Mas hoje o Senhor nos
convida a contemplá-lo como aquele que é capaz de dar a sua vida para
transformar a nossa: “mostrou-lhes as mãos e o lado”. Ou seja, Ele nos
mostra as provas, os sinais de sua amor.
Irmãos e irmãs, o mundo, marcado pelo ódio, pela vingança, pela falta de
amor e de esperança, precisa desse nosso testemunho. O Ressuscitado
também se oferece a nós hoje: Ele nos fala nas Escrituras e parte o pão
para nós. Que como os seus discípulos, nós possamos reconhecê-lo e
testemunhar: “Vimos o Senhor”. E como Tomé professar nossa fé: “Meu
Senhor e meu Deus”.

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