Dom Agostinho B. FAGUNDES, OSB
Meus caros irmãos e irmãs,
a liturgia deste 18º Domingo do Tempo Comum nos convida a aprofundar a compreensão que temos
da pessoa de Cristo Jesus, e do modo como o próprio Senhor se torna nosso sustento, nossa vida, nosso “pão” em nossa caminhada rumo à pátria celeste.
Os textos da liturgia de hoje são de uma riqueza muito grande, tornando-se muito difícil conseguirmos
abordar todas as reflexões que eles suscitam. Iniciemos pela primeira leitura, e que é uma chave para
compreendermos o Evangelho deste dia.
O povo encontra-se caminhando no deserto, depois de haver deixado o Egito – a terra da escravidão sob
o domínio do Faraó –, em direção à terra prometida – Israel. E diante do desafio da escassez de alimento, passam reclamar contra Moisés e Aarão. Naquele momento de crise, de sofrimento, de provação Percebe-se um estremecimento em sua fé. Começam a tirar os olhos que antes estavam virados para o futuro, para a esperança, para a confiança, para a vida nova que Deus estava lhes oferecendo, e passam a olhar para trás, para o passado, julgando que a escravidão é melhor, pois não trazia risco para eles. Quem de nós não compreende isso? Pois facilmente passamos a desconfiar de Deus. Pois parece que todas as vezes que queremos aprofundar a nossa vida de fé, de oração, de retomarmos um caminho de maior proximidade com Deus, ou fazemos um propósito de mudarmos certas situações em nossas vidas, ou perdoarmos e reconstruirmos certas relações, parece que as coisas começam a ficar mais difíceis. Vão surgindo empecilhos de todos os lados, e passamos a dizer que caminhar com Jesus Cristo é muito exigente, e que talvez fosse melhor se retornássemos à situação anterior.
O povo de Israel se esquece de tal maneira de todas as coisas que Deus já havia feito por eles e com eles
até aquele momento, que perguntam a Moisés: “porque nos trouxestes a este deserto?”. Já não se recordam de que não foi Moisés que os conduziu até ali, mas tudo foi uma ação do próprio Deus em favor deles. Desviam os olhos do Senhor e os colocam em Moisés, perdem a capacidade de ter um olhar de fé sobre a própria vida e tudo o que estão enfrentando. E o Senhor, em sua bondade e misericórdia, envia-lhes as codornizes e o maná, e este deverá ser recolhido a cada dia.
Em meio às dificuldades, provações ou desafios, o Senhor provê para nós o pão diário, a graça de que
necessitamos hoje, a força de que precisamos para enfrentar as dificuldades deste dia. A nossa vida está diante de nós, e este é o momento de tomarmos uma decisão: ou deixamos que Deus seja o Senhor de nossas vidas e confiamos a Ele tudo o que temos, as pessoas que amamos, as necessidades dos nossos irmãos, as provações que estamos enfrentando; ou continuaremos reclamando, deixando a tristeza tomar conta de nosso interior, confiando cada vez menos em Deus e em sua misericórdia, para podermos voltar à nossa vida acomodada, sem qualquer rumo e sentido. E assim Deus já não encontrará qualquer espaço para nos desinstalar de nós mesmos e nos mostrar que uma outra vida é possível para cada um de nós.
Não é exatamente sobre isso que nos ensina o Evangelho da liturgia de hoje? Ele é uma continuação do
Evangelho do domingo passado, quando ouvimos que Jesus multiplicou os pães e os peixes e todos comeram com fartura. Assim, dando prosseguimento à narrativa joanina, hoje ouvimos que a multidão vai atrás de Jesus em Cafarnaum. Mas Jesus os repreende, fazendo-os notar que o buscam porque ficaram saciados do pão material – que é tão importante para cada um de nós –, mas o mais fundamental é se alimentar do Pão da Vida, que é o próprio Cristo Jesus. A vida plena, abundante, transbordante e que permanece em nós até ao encontro definitivo com o Deus Vivo está escondida em Cristo Jesus, o qual se faz presente sacramentalmente por meio de Seu corpo e Seu sangue – pão e vinho eucarísticos. Acolher a pessoa de Jesus Cristo pela fé e viver em conformidade com Seu Reino é o que Deus nos oferece como caminho de salvação.
O cristão sabe que as dificuldades e desafios de hoje serão superados, o sofrimento atual passará, a doença e o luto um dia passarão. Mas que o desejo de Deus, a fome e a sede de sua presença são como uma ferida sempre aberta no coração de cada homem, e que só poderá ser saciada com a vida plena que nos vem de Deus na pessoa de Jesus Cristo, Nosso Senhor, nossa vida e nossa paz. Esforcemo-nos para acolher esta vida em nós e podermos irradiá-la para todos aqueles que nos cercam.