19º Domingo do Tempo Comum – C
Sb 18,6-9; Sl 32; Hb 11,1-2.8-19; Lc 12,32-48
7 de agosto de 2022
Homilia
A história, vista com olhos humanos, é quase sempre um pesadelo. Isso é verdade hoje, assim como era no tempo dos profetas do Antigo Testamento e na época de Jesus. Há sempre mais escândalos, opressão e agressão, mais guerras e limpezas étnicas do que podemos imaginar.
No entanto, devemos colocar tudo isso em um contexto mais amplo, em relação ao passado, é claro, mas sobretudo em relação ao futuro. Porque o passado pode nos ajudar a entender o que estamos vivendo hoje, mas é o futuro que dá sentido ao que estamos vivendo hoje. É por isso que Jesus nos convida a estarmos prontos para o dia do encontro final com nosso Deus. E isso podemos aprender com nossos ancestrais na fé, o Povo de Israel.
Deus era concebido pelo povo de Israel como o Deus do Êxodo, do Exílio, da Promessa. A concepção pagã de deus era a de uma presença imediata que conduzia a uma religião de ídolos. Israel não tinha ídolos; Israel adorava o nome do Deus da Promessa, e essa religião criava uma história – sagrada – que não era tanto a experiência de uma mudança contínua, mas a expectativa de realização. Explico melhor:
Eles viviam sempre no presente, mas o que viviam recebia sentido a partir daquilo que lhes era prometido para o futuro; e sua esperança para o futuro estava fundamentada no amor que Deus lhes havia mostrado no passado.
A primeira leitura de hoje, tirada do livro da Sabedoria, fala-nos da noite santa do Êxodo, durante a qual o povo de Israel foi tirado do Egito pelo Senhor. Já o Evangelho faz alusão à Grande Noite da Ressurreição de Cristo. Nenhuma dessas duas noites foi o fim de um processo histórico. A Ressurreição não foi o fim de nada. O sepulcro vazio não era um memorial de nostalgia. A ressurreição de Cristo, assim como o Êxodo do Egito, foi um evento de abertura para o futuro, que reafirmou e confirmou a promessa de Deus.
O sentido último de nossa existência não é encontrado nos eventos passados do povo de Israel, que saiu do Egito há cerca de três mil anos, e nem mesmo nos de Jesus, que saiu do túmulo há cerca de dois mil anos. Este sentido último encontra-se na ressurreição de toda a humanidade, na libertação total de todos os seres humanos da escravidão do pecado, da opressão, da guerra. É por isso que o chamado de Jesus a estarmos prontos e vigilantes não é um chamado à passividade. É um chamado a estarmos ativamente atentos, um chamado a trabalharmos pessoal e lucidamente para a realização da Promessa de Deus.
Não devemos entrar na história olhando somente para trás. O que somos chamados a fazer é construir um futuro que torne mais próxima a nossa libertação final e total, vivendo nosso presente de forma autêntica e responsável.
Não sabemos exatamente qual será o futuro de nossa sociedade, de nossa Igreja, de nossa comunidade. Mas acreditamos (na Fé) que haverá um futuro, e sabemos que esse futuro está nas mãos de Deus e será realizado com a nossa cooperação. E o fundamento dessa fé é que sabemos o que Deus foi para nós em nosso passado, em nossa história de vida.
Muitos de nossos planos não deram certo; muitas de nossas expectativas não se tornaram realidade. Assim como os discípulos de Emaús, percorrendo juntos o caminho, muitas vezes fazemos uma lista de nossas esperanças que não se concretizaram. Mas a fé na presença do divino Estrangeiro caminhando ao nosso lado nos assegura que ele realmente ressuscitou e que mais cedo ou mais tarde, com a nossa participação, ocorrerá a ressurreição final de toda a humanidade.
Celebremos esta fé, nesta Eucaristia, que agora continuaremos.
Dom Martinho do Carmo, osb