32º DOMINGO DO TC-B/ (Mc 12, 38-44)

D. Paulo DOMICIANO, OSB

A liturgia de hoje nos apresenta a figura de duas viúvas como modelos de obediência a Deus e à sua Palavra.

Na primeira leitura (1Rs 17, 10-16)o encontro do profeta Elias é precedido pela ordem recebida do Senhor nos versículos anteriores ao que ouvimos: “A palavra de Deus foi dirigida a Elias: levanta-te, vai a Sarepta da Fenícia para viver aí; eu ordenarei a uma viúva que te dê comida”. Movido pela fé nesta Palavra, Elias não exita em pedir o pouco que resta à viúva, aquilo que garantiria a ela e ao filho a última refeição.

Como nos anúncios sobre o plano de Deus, o profeta começa dizendo: “Não temas!” Então a mulher tem a coragem de crer e cumprir a Palavra e a promessa de Deus se cumpre: “e comeram, ele e ela e sua casa, durante muito tempo. A farinha da vasilha não acabou nem diminuiu o óleo da jarra, conforme o que o Senhor tinha dito por intermédio de Elias”.

O que mais chama a atenção nesse relato é que essa mulher é uma estrangeira, não pertence ao povo de Israel e, portanto, tem outros deuses. Mesmo assim ela acredita na Palavra de Deus e o milagre acontece em sua vida e de sua casa. Ela não teria nenhuma obrigação em acreditar, mas ousou crer. É uma lição para o povo de Deus. É uma lição para nós, que dizemos crer e servir a Deus, mas que nem sempre cremos em sua Palavra ou cumprimos o que ela nos pede.

Como esta mulher, estamos dispostos a abrir mão de nossas seguranças para fazer a vontade de Deus? Não se trata de grandes coisas… pode ser um punhado de farinha e um pouco de óleo o que Ele nos pede. A questão é: estou disposto a confiar em Deus?

A segunda viúva aparece no Evangelho. Ela também dá muito pouco, apenas duas moedas. Mas, como a viúva de Sarepta, ela dá tudo o que tem, não oferece aquilo que é supérfluo. Ao contrário dos ricos, que faziam grandes ofertas, ou daqueles que davam do que lhes sobrava e que não fazia falta, a viúva, como declara Jesus, “na sua pobreza, ofereceu tudo aquilo que possuía para viver”.

Ninguém percebe aquela mulher no meio da multidão. Em contraste com aqueles que Jesus denuncia no início de seu discurso, que gostam de andar com roupas vistosas, de ser cumprimentados nas praças e buscam os primeiros lugares, a viúva não está preocupada em querer chamar atenção. Como diríamos hoje, não está busca de curtidas ou likes… Ela faz a sua humilde oferta com liberdade plena, sem que ninguém, a não ser Deus, “que vê o escondido” (Mt 6,4), a veja. É Jesus que a vê; e não somente a vê, como a indica como modelo para os seus discípulos. Do mesmo modo, Ele vê os doutores da Lei e os aponta como exemplo a não ser seguido. Jesus nos vê… seremos apontados por Ele como um modelo a ser imitado ou um modelo a ser evitado?

Diferente da viúva que se encontra com o profeta, esta viúva aparece anônima e desaparece do mesmo modo. Não troca sequer uma palavra com Jesus… talvez não tenha nem mesmo cruzado o seu olhar com o Dele… não sabemos. Mas Jesus a vê, e isso basta.

Esta viúva, em sua pobreza e seu anonimato surge como modelo ao final de todo o ensinamento que Jesus dá a seus discípulos. (Estamos no final do capítulo 12 de Marcos e esta é a última lição que Jesus dá em sua escola de discípulos.) Sem ao menos saber disso, esta viúva é a que melhor compreendeu o que Jesus quis ensinar até agora e nos é proposta como modelo a ser imitado.  

Mas nós, que também frequentamos esta escola como discípulos de Cristo ao longo de todo este ano litúrgico, acompanhados pela catequese do Evangelista Marcos, estamos dispostos a aprender esta lição final?

O que atrai o olhar de Jesus sobre esta mulher é o fato de ela ter dado tudo, de ter aberto mão de suas seguranças. Sua recompensa está na paz e na liberdade de quem não está preocupado em se defender de nada, provar nada para ninguém, porque já entregou tudo. Os que vivem assim, alcançam a felicidade, a bem-aventurança. “Felizes os pobres em espírito, porque deles é o Reino dos Céus” (Mt 5,3) – como cantamos na aclamação ao Evangelho.

No fundo, Jesus se identifica com a viúva; porque Ele já está em Jerusalém e logo também terá de oferecer tudo a Deus, sem reserva nenhuma. É o que nos diz a segunda leitura (Hb 9,24-28); seu sacrifício, oferecido “uma vez por todas” aparece como a entrega total, última e definitiva.

Apontando para a viúva que dá tudo, Jesus revela-se a si mesmo como modelo de entrega total ao plano do Pai e convida cada um de seus discípulos a segui-lo nesta oferenda. A recompensa não será somente sustento para algum tempo, como para a viúva de Sarepta e Elias, ou o olhar amoroso de Jesus, como para a viúva no templo, mas a vida nova, a ressurreição; essa é a promessa para todo aquele que se decide a oferecer sua vida a Deus e obedecer sua Palavra.

O que faremos? Continuaremos com nossas reservas diante do apelo do Senhor, tentando guardar um punhado de farinha ou umas moedas no bolso para nossa segurança ou vamos confiar e lhe dar toda nossa vida para que Ele a transforme?

Que o exemplo da Virgem Maria, que em sua pobreza também soube dar seu tudo a Deus, olhe por nós para que tenhamos a coragem e a confiança de nos entregar aos planos de Deus e ao convite do Evangelho.

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