25º Domingo do Tempo Comum – C
Am 8,4-7; Sl 112; 1Tm 2,1-8; Lc 16,1-13
18 de setembro de 2022
Caros irmãos e irmãs. Por que os monges usam hábito? Porque o nosso hábito diz ao mundo que estamos a serviço de todos, assumindo o serviço do silêncio, do louvor, da Palavra, da Oração. O hábito também é uma maneira de dizer ao Senhor que queremos ser totalmente d’Ele. É ainda um sinal de pertença a uma comunidade e a uma maneira de simplicidade simbolizada pelo modo de nos vestirmos. Mas eu gostaria de enfatizar outro motivo. A vida monástica é uma vida espontaneamente voltada para a eternidade. Temos os pés no chão – ao menos, assim espero! – mas nossa vida declaradamente quer antecipar a eternidade. Isso é o que nossas vestes significam. Este é um serviço que o Senhor nos pede: lembrar à Igreja (Povo de Deus) e ao mundo que, por pura misericórdia, todos somos chamados a uma eternidade transbordante de vida e de alegria. Ora, o que existe de mais certo e indubitável para nós é a ressurreição. Porque Jesus ressuscitou, porque Ele “se entregou em resgate por TODOS” (1Tm 2,6), nós cristãos temos esse particular (que o mundo não entende): nós encaramos a vida presente e tomamos nossas decisões à luz da vida eterna. E é isso que Jesus nos ensina no Evangelho quando nos fala sobre o dinheiro: vivam vossa relação com o dinheiro à luz desta profunda verdade: TODOS somos predestinados à alegria eterna.
Tomemos o Evangelho. Como Jesus fala do dinheiro? Jesus dele fala dando-lhe o nome próprio de “Mamom” (מָמוֹן, μαμωνας). Jesus nos mostra que, naquele tempo – e ainda hoje –, o ser humano personifica o dinheiro. Sim, temos de reconhecer que o dinheiro é uma realidade com a qual temos um relacionamento. Para o mundo, o dinheiro é um “alguém” – só para não dizer que é ídolo… E, em vez de nos servirmos dele, servimos a ele. Isso está em mim, e em cada um de nós, na medida em que o espírito mundano nos domina.
Ouvimos na primeira leitura o profeta Amós falar daqueles que aguardam ansiosamente o fim do sábado (para os judeus, o dia santo de descanso) para retomar seus soberbos negócios. Há alguns anos atrás, o Papa Francisco disse algo semelhante a respeito dos cristãos que vão à missa só para garantir um certo status social, mas que, na verdade, são mesmo apaixonados por seus trabalhos e seus negócios. O papa acrescentava que o diabo nos leva a agir assim: ele se utiliza da riqueza, para que nos sintamos autossuficientes, conduzindo-nos assim à vaidade, fazendo nos sentirmos importantes, até que chegamos ao orgulho de achar que podemos ser felizes sem Deus. Uma “realidade sem Deus”, eis uma das características do inferno! O poder do dinheiro sobre nós pode ser imenso; ele pode nos desviar da fé, pode até mesmo nos fazer perder a fé. É por isso que Jesus é tão veemente em nos tirar dessa armadilha.
Mas como sair dessa armadilha que a sociedade nos colocou, quer queiramos ou não, quer sejamos ricos ou pobres? A resposta do Evangelho é clara: ver o dinheiro à luz da eternidade, usar dos bens deste mundo em vista das “moradas eternas” (Lc 16,9). E o que vemos quando olhamos para o dinheiro desta forma? Jesus nos dá quatro chaves.
A primeira é simples: num discurso sobre o uso do dinheiro em vista dos bens eternos, Jesus cita aquele que é “fiel nas pequenas coisas” (Lc 16,10). Portanto, o dinheiro é uma “pequena coisa” (do grego ἐλάχιστος: “o mínimo”), e assim devemos lidar com ele. Ora, o que é um milhão de dólares diante da eternidade, ou diante da eterna glória que nos é prometida?
E depois de pedir uma atitude de fé com relação ao uso do dinheiro, Jesus nos entrega a segunda chave, dizendo que o dinheiro não é o “verdadeiro bem” (Lc 16,11). E qual é o verdadeiro bem? Qual seria o bem que corresponde à nossa dignidade? Seria o dinheiro? Claro que não! É o amor de Deus. O único bem que ninguém pode tirar de nós, o único bem que nem a morte pode nos despojar é o amor de Deus! Jesus diz que o dinheiro é o “Mamom” de injustiça, e isso quer dizer que quando nos apegamos a ele, ele nos torna “não-justos”: não somos mais “ajustados” a Deus e ao seu amor, e não somos mais ajustados na caridade aos irmãos e irmãs. Apegar-se ao dinheiro ao invés de apegar-se ao amor de Deus pode nos corroer interiormente e nos levar a todo o tipo de corrupção.
Unindo as duas primeiras chaves, chegamos a uma terceira: reconhecemos que o dinheiro não é o verdadeiro bem, mas é um pequeno bem, e que nos é exterior. Se nos apegamos ao dinheiro, podemos acreditar que possuímos dinheiro, mas é o dinheiro que nos possui e nos tira de nós mesmos. O único bem que é realmente “nosso” é o Reino de Deus, é a vitória de Jesus sobre o pecado e a morte. E, ao contrário do dinheiro que nos é exterior, este bem está dentro de nós desde o Batismo.
A quarta chave que também nos é dada pela parábola, pode ser resumida da seguinte forma: deveríamos ser tão habilidosos em enriquecer os pobres quanto alguns políticos são habilidosos em enriquecer a si mesmos! Devemos ser muito hábeis com o dinheiro. Devemos nos servir do nosso dinheiro para preparar para nós uma boa acolhida no Céu. O dinheiro não é um mal em si, pois quando ele é usado para fazer o bem aos outros e, principalmente, aos mais necessitados, então o dinheiro nos coloca no caminho para o Reino dos céus. E este é o melhor investimento que podemos fazer! Existem pobres que cuidam dos mais pobres de uma maneira admirável. Existem pessoas ricas que cuidam dos mais pobres de uma maneira igualmente admirável. O que está em jogo, então, não é ter ou não ter dinheiro, mas a nossa capacidade de compartilhar aquilo que nos é confiado. O desafio é claro: quer sejamos ricos, quer sejamos pobres, desde que saibamos compartilhar aquilo que temos, podemos desde já começar a viver a eternidade!
Irmãos e irmãs, à luz deste Evangelho, perguntemo-nos: do que temos mais necessidade? Respondo: de uma boa injeção de esperança! Se nossa esperança é uma espécie de neblina onde nada é muito claro, pode ser um sinal de que permanecemos demasiado apegados a este mundo, e aos bens deste mundo. De qualquer forma, peçamos ao Senhor que torne nossa esperança firme, brilhante e alegre, e isso já será para nós uma extraordinária libertação!
Termino falando-vos novamente dos sinais religiosos. Certamente, pode ser bom usar uma cruz ou um hábito religioso. Mas o sinal religioso que, para nós cristãos, é essencial não é aquilo que usamos ou vestimos, mas o que somos. Cabe a todos nós tornarmo-nos sinais religiosos, testemunhando concretamente em nossas vidas essa esperança cristã da vida e da felicidade eternas! Amém.
Dom Martinho do Carmo, osb